quinta-feira, maio 31, 2007

Hoje chove, sabias?

Hoje chove, sabias? Andei pela rua a molhar os pés, a deambular no meu caminho para casa. E não sei como aqui vim parar. E depois, quando menos se espera, surge de rompante uma música que nos ficou no ouvido o dia todo: aí, relemos e relemos um texto que ficou pelas nossas mãos, imaginamos milhares de coisas a voar pela pele, à espera de um local propício e carnudo para aterrar, onde um dia irá sobressair uma marca, uma cicatriz, um rosto.
Asfixio, gelo-me e não me consigo mexer - o meu pior medo.
Estou sobre um penhasco, os meus pés são gigantescos e mesmo assim não chegam ao chão. Lágrimas vertem do solo, por entre a erva e os paus quebrados ou queimados.
Estou não sei onde. Não sei o que faço.
A minha embriaguez verga-me a um silêncio abrupto que não consigo lavar ou alargar, em redor do meu pescoço.
O tempo está a correr daqui para fora.
E tu, onde estás?
Eu estou a cair vertiginosamente, a vontade de me deixar cair subjuga-me à inércia de agradecer o frio que vem do norte, onde eu nunca fui.
Asfixio novamente.
A garganta implode energicamente, as minhas mãos vibram por mim acima sem saber o que encontrar...
Silenciei-me.
Não sei o que silenciei dentro de mim, ou quem silenciei fora de mim, sei que toda eu fiquei em silêncio, sem me mexer, sem voz, tacto, visão. É nestas alturas que um sorriso estúpido nos sobe à cara e não sabemos mais o que dizer, quando dizer. As palavras atropelam-se dentro de nós, enrolam-se-nos na boca e os lábios continuam cerrados - e mesmo assim os meus sorriem.

terça-feira, maio 29, 2007

Ontem disseram-me que o coração é uma mentira de um homem louco que viveu há muitos anos atrás. Disseram-me também que o amor não mora no coração. Mora nos ouvidos e na língua e que quando paramos de lamber os lábios esfaimados de beijos, então o amor morreu.

quinta-feira, maio 24, 2007

Os abandonos vivem-nos para sempre gelados nos dedos


Que a vida é um mar sem pé e sem direcção eu já sabia. Que ela me ía enganar de modo tão trapaceiro, apenas descobri há algum tempo. E dessa descoberta suguei intensos estados de espírito que me lançaram na descoberta de novos horizontes de mim mesma.
Confiar na desconfiança?
Mau mestre, mau caminho, por aí não.
Seguir a intuição... único caminho a percorrer pelos pés feridos quando o medo avança.
Nada na vida é linear.
Conheces o amor?
Conheces a traição do amor?
Sinto-me encardida de amor e naúsea.
Tenho a mente corrompida de tantos silêncios inesperados. Não poderei chamar-lhe tristeza. Talvez uma amarga melancolia. Talvez uma solidão que se alojou profundo na alma.
Quando a solidão se torna a nossa única esperança de sobrevivência, descobres a tua face no espelho. E o reflexo nunca é o que esperavas.

quarta-feira, maio 23, 2007


Existem tristezas tão profundas que se recusam a sair cá para fora.
Vivem em nós para sempre. Abraçadas ao nosso coração.

terça-feira, maio 22, 2007

O Poeta

Por vezes retiram-te o mundo e varrem os restos dos desaparecidos para debaixo do tapete. E há alturas em que, por acidente, nos acercamos do chão, demasiado próximos como que em confidência, e recordamos que, algures, por aí, existe quem, nos recorde as marcas que tivémos outrora e que agora só ardem de quando em vez. Por tudo isso juntamos os molhos de fotografias usadas e que não ousámos deitar fora, os lápis de cor da infância que tanto tempo desenharam; as roupas já gastas e que não se apegam mais ao corpo, como os outros que nos cercam: por fim, tudo se junta no centro da sala exangue: exorcisam-se os olhares de desejo que nos tocaram ao de leve e, depois de tudo, olhando sôfregos pelo tapete, deparamo-nos com aquilo que já lá não está e não sabemos mais quem somos.
Sérgio Xarepe
Espero que sintam tanto como eu ou mais ainda, porque palavras assim, só mesmo quem as conhece por dentro.

segunda-feira, maio 21, 2007

Sou eu


Sinto-me fechada, a fechar
devagar, a parar
uma angústia penetrante de sabor a nada...
Tantos anos, a viver de imaginação, de sonhos adiados
a perseguir o sonho, sabendo de um saber tão inexperiente
que é mais forte e corajoso que qualquer realidade,
que o pleno existe,

e afinal...
e agora...

Devolvam-me a intensidade, o encanto, o raiar dos limites,
a euforia do momento, a capacidade de ignorar que o amanhã existe,
a fúria libertadora, a paixão inebriante, a vontade de estalar e arder de seguida
da languidez do mel que percorre a coluna vertebral e quebra as pernas...

Porquê?

Porque é que me infligiram esta violência brutal, de que a entrega total é excesso pecatório e assusta o comum mortal.
Tinham mesmo que me reprimir, castrar, violentar desta maneira?

Sim, SOU EU,
para além de tudo o resto que esperam de mim, das provas que dei, da cabeça que levantei, dos monstros que engoli, das responsabilidades a que respondi, das concessões a que cedi, das expectativas a que correspondi, fui capaz, fiz!

Agora não quero mais, não estou a conseguir, larguem-me, libertem-me, não sou capaz de continuar se me exigirem só esse eu, não me matem a chama...

Esta também SOU EU, esta acima de tudo e debaixo da aparência SOU EU!

Todo o meu conjunto, pede, implora, exige!
Não matem a SOU EU, porque senão o resto morre, ou pior vegeta numa insipidez nojenta e incolor, que retira o valor a qualquer prova grandiosa que eu possa entregar em jeito de oferenda, sacrifício ritual, da vossa voracidade cinzenta, mas que mesmo assim ainda me provoca ternura, pela necessidade de verem a menina (dissimulada), que fez, com o olhar, a (falsa) promessa, de se transformar na mulher perfeita - que não sou eu.








sexta-feira, maio 18, 2007

E quando as palavras não significam nada?


E quando as palavras não significam nada?
Quando procuramos uma saída perfeita para a nossa incompreensão dos factos que se sucedem na nossa vida em espiral.
A sempre eterna espiral.
Insegurança.
Medos.
Sonhos desfeitos.
Peles trocadas à força pela vida.
Decisões jamais tomadas.
E quando as palavras não significam nada,
para além de sílabas confusas e perdidas na minha mente ferida.
As palavras não significam nada.
Não trazem nada de novo.
Não abrem as portas que tu fechas.
Quando as palavras são pouco para expressar tudo o que sentimos no mais íntimo do nosso ser, sentamo-nos a tecer o silêncio.
O silêncio é a comunicação última.
Abraço o silêncio.
Perfumo-o.
Trago-o em mim.

quarta-feira, maio 16, 2007

Apenas eu

Os anos passam e com eles esvai-se a inocência da felicidade.
Todos os meus sonhos se estão suavemente a desvanecer nos dedos finos. Embora eu renasça por entre eles e delicadamente tente, em vão, criar novos sonhos e esperanças para substituir os que morrem todos os dias.
Sonhos que foram sonhos.
Sonhos que foram impossibilidades.
Impossibilidades que foram sonhos.
É o que guardo nas gavetas do meu quarto.
Aqui estou eu.
As minhas asas rasgadas de sonhos incumpridos.
Tenho a voz calada, neste mundo onde se finge que se é muito mais do que podemos ser.
Onde tudo o que importa é:
consumismo,
dinheiro,
intrigas,
hipócrisia.
E aqui estou eu.
As minhas mãos tateiam o espaço circundante e tento sentir o meu corpo como um refúgio contra as vozes que acusam, que julgam e condenam.
E aqui estou eu, apenas eu... incerta, magoada, quebrada...
... apenas eu...
E eu... sou miseravelmente pouco.
Miseravelmente humana.

sexta-feira, maio 11, 2007

E eu serei eu. Mesmo quando finjo ser outra.



São as lágrimas que se cristalizam na garganta e criam um imenso nó.

Elas já não descem pelos olhos. Desaprenderam esse movimento ancestral. Agora só querem viver eternamente nas minhas cordas vocais, onde se depositam e se deixam desfalecer.

O cansaço é uma doença que nos deixa fracos. E eu estou tão cansada... Quando acordo penso que acordo para um novo sonho, porque tudo se me é baço aos olhos.

Sorrio para os outros, afago-lhes as suas temeridades e sussurro que a vida é um imenso rol de pedras na estrada e que nem por isso a estrada acaba.

E é verdade... quem acaba sou eu. Eu é que me acabo nestes silêncios, nestas constantes implosões, nestes destroços que escondo por trás do ar confiante.

Sabes... às vezes quero-te dizer que a dor é demasiado real para ser apenas alucinação.

terça-feira, maio 08, 2007

Agasalho-me na cumplicidade da escrita e assumo que estou de volta.

Agasalho-me na cumplicidade da escrita e assumo que estou de volta.
O regresso, esse, deu-se com a naturalidade das palavras soltas em busca de um rumo.
O que me leva a escrever é um sentimento que não recomendo. Trata-se de algo parecido com o que se teve e não se tem agora e jamais se poderá ter, porque o mundo é grande e não consigo encontrar-te, não tenho pistas que me levem a ti.
O rasto que deixás-te já o tempo se encarregou de levar consigo para outros endereços que desconheço infelizmente.
Penso que a sinceridade que fui te afastou de mim para sempre.
Será que deveria ter omitido algo?
Talvez. Mas não o fiz.

segunda-feira, maio 07, 2007

Falta-me descobrir que ser sou

Houve um fantasma incendiário que destruíu os sorrisos, que o mesmo é dizer que destruíu a música da alma. Agora, no rescaldo, só cinzas e uma esperança que resistiu ao destruidor. Um ser forte e decidido não olha para o tempo anterior ao fantasma, não se perde em bucolismos e despreza a esperança que ali ficou. Só um sonhador se agarra à utopia, confessa o desalento e se apega à esperança ali plantada no meio do caos. Falta-me descobrir que ser sou: se um dos dois ou um híbrido de ambos.
É o sonho que comanda a Vida, independentemente de tudo. Utopia significa projecto que a ser exequível asseguraria a felicidade geral.
Que mal tem viver com esse sonho?

quinta-feira, maio 03, 2007

Dois destinos

A razão magoa o sentimento,
o sentimento turva a razão.
Reduzir a temperatura do corpo, as batidas do coração,
escutar a respiração compassada, cada vez menos interessada em continuar,
pensamento no vazio,
estado de letargia total,
parar...
... o tempo passa e a diferença entre dois seres humanos,
mede-se também pela capacidade de reacção ao desalento,
uns (como muitos) baixam os braços,
outros (como poucos) continuam a sua caminhada,
conceitos diferentes de verticalidade e horizontalidade,
duas vidas, duas almas...
dois destinos.

terça-feira, maio 01, 2007

Perdi o meu tempo porque não percebi que era a única que o seguia.