quinta-feira, agosto 28, 2008

Esquecimento

Tinhas o olhar no limite da melancolia. Num qualquer sinal indecifrável (de emergência?!) que eu não consegui desvendar. O olhar achocolatado deu lugar a uma voz rouca e sumida. Trazias uma armadilha por detrás do sorriso que eu julgava ser apenas cúmplice de segredos ainda por revelar.
Não soube reconhecer o remorso que te habitava os olhos, esse tal ladrão (tão conhecido) que ajuda a desfolhar lentamente o deslumbramento cada vez mais dissolvido no vaguear dos ponteiros tontos do relógio.
Só me lembrei da chama que me aqueceu o peito e que me deixou o coração a palpitar de novo, num ritmo desenfreado, quase perdido na loucura das labaredas do teu lume cego. Desculpa.
Só me apercebi dos lampejos de desejo, aqueles que te assaltaram o rosto naquele instante. Não pedi autorização para descobrir a beleza dos mistérios proibidos, sempre longe da razão.
Sustive a respiração para não fazer barulho, porque a voz do coração é muito pequena, e fiquei assim até me ouvires. Mas o barulho do meu coração só te trouxe o vento. Batia com mais força com o silêncio. E disso não estava eu à espera. Arder é pecado e eu não sabia. Tanta verdade devia doer nos olhos, na ponta dos dedos e até na língua. Em todo o lado. Também nos ouvidos. Tenho os olhos cheios de palavras mas nos meus ouvidos já há demasiado silêncio. Ouvi cada passo teu, quando te foste embora, primeiro fora e depois dentro de mim... A porta primeiro abriu-se, depois fechou-se e o silêncio ficou lá fora. Cá dentro, só o peso das minhas lágrimas ainda por cair.
Queria ter-te perguntado: O que significa quando se tem sempre na cabeça os olhos de alguém? Terias respondido que é impossível roubar os olhos de uma pessoa e metê-los na cabeça. Que isso nunca acontece. Que o amor se desfaz nas frases adversas e nos momentos maus, nas ausências impossíveis de curar. Por isso fiquei calada, perdida na calma aparente de quem sabe para onde vai: esse paraíso flutuante do esquecimento.
Até amanhã.