quinta-feira, março 08, 2007

Ela

Ela tinha o dom de lhe roubar as palavras, como se fosse mesmo possível roubar as palavras a alguém. Mas Ela conseguia. E fazia-o com um sorrisso tão natural que ninguém acreditaria que pudesse de facto roubar.
E ele sorria, envergonhado, por não ter palavras para dizer. Então, Ela, já sem sorriso, mas com os olhos de desejo, pedia-lhe para fazerem amor. Ele sem palavras, beijava-a como se dissesse sim. E então, o mundo eram eles. Ele dizia que a adorava muito. Eram felizes, muito felizes, até um dia.

terça-feira, março 06, 2007

Somos todos fingidores e todos ridiculamente honestos. Mas nem todos somos resignados...

Inverdades que nem chegavam a ser mentiras. Cenários que nunca passaram do papel. Personagens fictícias que nem souberam representar. Os tempos passam e as palavras vão rareando. O alter-ego está em coma e não quer ser incomodado.
Disse-lhe que talvez já não valesse a pena. Que as palavras nada podiam mudar. Que o mundo havia ensurdecido. Mostrei-lhe como o mundo já não se via. O espelho da consciência havia deixado de reflectir.
Disse-lhe que escrevia para dizer aquilo que ninguém queria ouvir. Não acreditou.
Preferiu acreditar que tudo era mentira.

sexta-feira, março 02, 2007

Fecho a porta atrás de mim

Às vezes é preciso desistir.
Deixar para outro.
Ouvir palavras diferentes.
Procurar melhor ângulo.
Uma tentativa de falhas.
Acertadamente planeadas.
Por aquele acaso que ninguém entende.
Às vezes há jogadas de soletrar.
Letras desconhecidas.
A conformidade de uma contradição.
Às vezes é preciso repetir.
Reformular.
Na imaterial procura do outro.
De um mesmo.
Que não sendo parte de nós é simplesmente um todo.
E às vezes, só às vezes, vislumbra-se em tonalidades mais ou menos viciadas.
Um sapo.
Fragmento.
Fachada de um Principe deposto.

quinta-feira, março 01, 2007

E então percebi que tinha tudo o quanto a cegueira permitia.

Os fragmentos não são necessários quando queres o corpo de alguém,
mesmo até,
quando nesse corpo te perdes.
Parte de um todo não tem obrigatoriedade.
O extracto ou resto de uma obra não tem necessáriamente de ter objectivo.
Apenas se lhe confere a prepotência de ser tudo.