sexta-feira, setembro 28, 2007

Auge


Sinto-te.
Embora não estejas cá.
Será que compreendes isso? A presença subtil de uma ausência amarga e inevitável.
Sinto-te.
Mas não estás em mim.
Estás algures perdido nos teus mundos... tento em vão perder-me nos teus braços. Bato aos portões desse céu onde te resguardas.
Sugo-te.
Sim, amor, sugo-te quando penetro o teu céu. A luz incandeia-me.
Preciso da escuridão para conseguir esvoaçar pelos espaços vazios do amor.
E tu perguntas-te: "mas o amor tem vazio ?"
E eu desiludo-te ao dizer-te, que logicamente, como tudo o que é imperfeito, tem vazios profundos.
Sim, o amor é imperfeito.
Mas porquê? - pensas tu. Porque senão morríamos extasiados com o seu brilho estupidamente inebriante.
E isso ainda não aconteceu
Ainda.
Embora eu anseie pelo momento em que iremos ambos morrer depois do orgasmo, cobertos de suor.
Tudo o que é sublime é fugaz, meu amor.
É por isso que o orgasmo dura alguns segundos e não horas inteiras. Porque assim que nos habituássemos a ele, não o iríamos mais saborear. Porque iria ser banal, comum, estúpido.
Nós não somos fugazes. Mas eu rezo, eu mastigo o momento do fim.
Do fim deste momento ridiculamente perfeito.
O teu céu desafia o meu parco equilibrio.
Preciso de um ponto negro onde me agarrar.
Um varão de escada, sempre a descer.
Para um poeta a escada é sempre a descer. Nunca a subir.
É de sentido único.
Mas para um amante a escada é o fim do possível.
Para o amante a escada é o dilema. O dilema de assassinar o amor, atirando o corpo mole pelos degraus de pedra fria. E assim tornar o amor imortal porque ficou espelhado no último sorriso. Nos olhos abertos e cheios de uma última imagem.
O auge é a escada de todo o amante, aquela que leva à última imagem ... a imagem da perfeição que nos escorre pelos dedos, apenas porque não foi terminada no seu auge.

segunda-feira, setembro 24, 2007

Azar. Não é para agradar. Nunca foi. Nada do que digo, faço ou penso.
E hoje, nesta manhã de sol com cheiro e sabor a Outono, penso. Penso e penso e penso e chego a nenhuma conclusão. Sem sono, sem cansaço, sem distracção física, não me concentro. Tão decidida, tão empenhada e não me concentro.
Uma hora, duas, três. Tudo na mesma.
"Há dias assim". Mas não pode haver. Não pode. Porque o tempo passa. A tensão aumenta estupidamente e sem fundamento, arrisco dizer que virei a concluir.
Quero apenas o que sempre quis.
Ser eu. Com tudo quanto isso implica.
E como custa às vezes ser de outra maneira.
Mesmo que o não queira.

sexta-feira, setembro 21, 2007


O que a vida tem de delírio é não reconhecermos a nossa própria máscara.

terça-feira, setembro 11, 2007


Acordei com um medo imenso. Um terror tão grande. Uma dor sem fim.
Voltar a dormir não era solução, nem tão pouco tinha sono para cerrar de novo as pálpebras e entrar na terra, na ilusão sobre a realidade ( passada, actual ou presumida).
Manter o corpo acordado assustava demais.
Simplesmente estilhaçava cada pedaço de mim, na dúvida, na (in)certeza do que sabia.
Voltar a dormir não afastaria a impotência de encontrar resposta... e manter o corpo acordado simplesmente fazia crescer um aperto no peito, na alma e na inteligência.
Não adormeci. Não acordei.
Fiquei na fronteira.

segunda-feira, setembro 03, 2007

E de mim tenho a ténue imagem de resignação. De silêncio. Assim te tive.

De ti não vou guardar nada que não deixes. Isto porque as coisas que tenho são minhas, neste momento. Deixaram-te, ultrapassaram-me de uma forma que não conheço e juntaram-se a outras cicatrizes que passeio, com o meu corpo. Não sei o tempo que passou desde a última vez que vieste aqui, nem sei sequer se, depois disso, retornaste a este lugar onde agora estou. Se vieste, perdoa. Olho em volta mas de ti não há sinal, logo não consegui perceber que o teu perfume rondava no ar. Talvez a minha doença seja essa: não saber quando estás ou quando partiste. Não ter a certeza definida de que os teus passos ladeiam as minhas memórias e que, no chão, se estendem cobertas e lençóis. Permaneço de pé, para que seja diferente, para que as semelhanças não me façam deitar novamente, de face encostada à almofada, e sentir que, ali, nada mais importa. Mas a meia-noite passou. Fiquei surpresa com a velocidade a que as memórias nascem, crescem, fornicam, morrem e deixam pó nos olhos.
E de mim tenho a ténue imagem de resignação. De silêncio. Assim te tive.